sexta-feira, 7 de março de 2014

A crise na Ucrânia e o impacto global

Gasoduto na Ucrânia (AFP)Preço de gás, petróleo e outras commodities é diretamente afetado pela disputa entre Kiev e Moscou

A economia pode ser um ponto-chave para a resolução do impasse na Ucrânia, que tem como pano de fundo divergências entre Moscou, Kiev e a União Europeia (UE) - mas também três das commodities mais importantes do mundo, o gás, o trigo e o milho.

A Ucrânia é a terceira maior exportadora de trigo e milho do mundo, e a Rússia supre um quarto das necessidades europeias de gás, em grande parte via gasodutos que passam por Desconfiança de Putin com Ocidente ajuda a explicar ação russa na Ucrânia

O temor de uma guerra entre Rússia e Ucrânia já afeta preços internacionais. Nesta semana, o trigo chegou a seu valor máximo em 17 meses, e o milho alcançou o preço mais alto desde setembro. Na segunda-feira, o gás chegou a subir 10%.

Segundo David Dalton, editor de Leste Europeu da Economist Intelligence Unit (EIU), braço de pesquisas da revista britânica The Economist, os interesses econômicos em jogo podem desequilibrar a balança.

"A Rússia e o Ocidente estão muito interconectados. A Rússia depende de seus lucros com combustíveis. Ao mesmo tempo, Alemanha e Reino Unido têm adotado uma posição mais negociadora, por conta da dependência alemã do gás russo e dos interesses financeiros russos no sistema financeiro britânico. A tudo isso somam-se o milho e o trigo", disse Dalton à BBC Mundo.

Abastecimento

EUA e UE têm boas razões para temer que a crise coloque em perigo a levíssima recuperação econômica dos países desenvolvidos.

"A União Europeia está em situação frágil e o que menos precisa é de pressões inflacionárias associadas aos preços dos alimentos, como ocorreu antes da crise financeira de 2008", prosseguiu Dalton.

"Alterações no fornecimento de gás à Europa seria igualmente preocupante. E sequer é preciso que algo aconteça - basta que exista a ameaça. Se a crise se aprofunda, o impacto será global."

O perigo de desabastecimento de gás tem antecedentes nos últimos anos.

Em 1º de janeiro de 2005, a Rússia cortou o fornecimento de gás à Europa que atravessava a Ucrânia, por conta de uma disputa por preços. Em 2009, houve uma séria queda no abastecimento europeu por conta de dívidas acumuladas de Kiev com Moscou.

As duas crises fizeram com que os países da UE melhorassem sua capacidade de abastecimento.

Hoje, com mais rotas de gás alternativas à Ucrânia e um inverno menos rigoroso, a UE está mais bem preparada para emergências.

O maior consumidor de gás russo na União Europeia, a Alemanha, tem uma capacidade de armazenar gás suficiente para cobrir dois meses de demanda e se aproveita de gaseodutos que atravessam o mar Báltico. Os países da Europa Central, também muito dependentes da Rússia, têm armazenamento suficiente para três meses.

Mas não é o caso do trigo e do milho.

"Hoje, estas são duas das commodites com os preços mais altos , por conta do perigo de interrupções no fornecimento mundial, ao que se soma o inverno americano de baixas temperaturas - tudo isso impacta a oferta futura", disse à BBC Mundo Ole Hansen, do departamento de matérias-primas do Saxo Bank.

Pôquer

A queda de braços entre Rússia e Ucrânia tem uma dinâmica própria.

A aprovação, pela Câmara Alta russa, do envio de tropas à Crimeia, no sábado, teve um claro impacto na economia russa.

O rublo teve forte queda em relação ao dólar, e a bolsa de Moscou caiu 10%. O Banco Central do país se viu forçado a aumentar as taxas de juros para sustentar a moeda.

"É uma situação com impacto recessivo, mas por outro lado, a alta do gás e do petróleo beneficia a Rússia, cuja economia se baseia nesses produtos", apontou Dalton.

Já a Ucrânia é um país virtualmente falido. O país tem vencimentos de US$ 13 bilhões de sua dívida neste ano, e mais US$ 16 bilhões no ano que vem.

Em meio à crise, a Rússia suspendeu a ajuda de US$ 15 bilhões - que poderia evitar a moratória ucraniana.

Nesta quarta-feira, a UE anunciou um pacote de ajuda a Kiev com esse mesmo valor nos próximos dois anos, na forma de empréstimos.

Uma missão do FMI iniciada nesta semana tentará avaliar "reformas necessárias" para que a Ucrânia se habilite a um empréstimo do Fundo.

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